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O Jogo, o lado lúdico da humanidade

Os videojogos e os desportos eletrónicos parecem-me definir uma nova realidade. Aqui parece prevalecer o negócio, sendo este, e não as habilidades técnico-físicas, a permitir que comece o jogo.

20 setembro 2021 > 00:00

Depois de termos refletido sobre a raiz do jogo ocidental, Os Jogos Olímpicos, impõe-se uma reflexão profícua sobre o entendimento de sempre do jogo, afrancesadamente apelidado de desporto e as suas variantes hodiernas (ex. modalidades). Para o sociólogo Roger Caillois (na usa obra, Os Jogos e os Homens, de 1958), o jogo é sempre uma atividade livre, que se pode ou não realizar, e sempre circunscrita no tempo e no espaço, desenvolvendo-se num quadro normativo (as regras sempre fizeram parte do jogo).

Esta é uma atividade improdutiva (pois não tem por fim último produzir bens), indeterminada quanto ao seu desfecho (não se sabe à partida quem ganha ou quem perde, nem o como) e que consensualmente pertence a um nível segundo e a um plano que se destaca da realidade habitual (e aqui assemelha-se ao culto e ao rito). Com esta definição, que me parece abrangente (síntese) de todas as correntes de pensamento ocidental sobre o jogo/desporto, este pode e deve ser entendido como um princípio lúdico e aberto de inventividade, bem como a sua estreita ligação, como experiência, à experiência da dádiva (a competitividade estabelece uma relação de reversibilidade – hoje ganha, amanhã perde / o que doa agora, amanhã pode precisar).

O vimaranense, capitão da seleção portuguesa de andebol, Rui Silva questionado (pelo Expresso de 19.03.2021) sobre os objetivos para os Jogos Olímpicos, respondeu: “Desfrutar, e no final fazem-se as contas. São 12 equipas, no Mundial eram 32. Mesmo que sejam mais fortes, são menos, logo estaremos mais perto [risos]”. Este é espírito de um verdadeiro desportista, que olha para o jogo como momento lúdico e competitivo, mesmo que neste encontre o seu sustento (“O que ganho dá para ter uma vida confortável, fazer um pé de meia, mas tenho de pensar no futuro”) e a sua realização como atleta (“ir mais longe como atleta”). Nesta entrevista vemos plasmar a definição de Caillois, mas nem sempre é assim. Os videojogos e os desportos eletrónicos parecem-me definir uma nova realidade, para a qual ainda não me entendo capaz de avaliar com rigor intelectual. Aqui parece prevalecer o negócio, mais que o jogo, sendo este, e não as habilidades e capacidades técnico-físicas, a permitir que comece o jogo.

A Federação Portuguesa de Desportos Eletrónicos faz a distinção entre gaming (“o ato de uma pessoa jogar um videojogo, de forma regular ou esporádica, sem uma componente competitiva organizada”) e desporto eletrónico (“uma pessoa ou equipa jogar um videojogo de forma necessariamente competitiva e organizada”), contudo o que parece entusiasmar os promotores destes são as receitas e uma economia de serviços em grande escala. Mas é igualmente verdade que os desportos tradicionais, entre nós o futebol profissional, se move nestas mesmas areias movediças.

A lógica capitalista impôs ao jogo o lucro e o útil, o que me leva a questionar: onde fica o lúdico na viela estreita destes jogos? Ou como muitos dos seus aficionados dizem: “estes jogos não são mesmo uma brincadeira de crianças”. E se não servem para brincar (ludus), para que servem?

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