Campeonato mais curto. Há 50 anos, Vitória percorria dobro dos quilómetros
Mapa da 1.ª Divisão concentra emblemas a norte, com a AF Braga em destaque. Mas nem sempre foi assim: hegemonia passou de sul para norte. O Vitória SC percorre hoje metade dos quilómetros de 1972.

O mapa futebolístico do país, no que ao principal escalão diz respeito, está em constante mutação. A cada época sobem e descem clubes que vão alterando a distribuição dos clubes pelos pontos cardiais, mas há uma tendência inequívoca. A hegemonia do futebol português, olhando apenas para os clubes da 1.ª Divisão, está agora centrada no norte do país, alicerçando-se na Associação de Futebol de Braga, a associação regional que atualmente empresta mais clubes à Liga Bwin.
O Jornal de Guimarães traçou o mapa do futebol da temporada 72/73, há cinquenta anos, e também da época 97/98, comparando-os com o panorama atual. Uma das conclusões que se pode tirar, desde logo, como analisaremos mais à frente, é que esta temporada o Vitória SC terá de percorrer um número consideravelmente inferior de quilómetros, comparativamente com o que acontecia há 50 e há 25 anos.
Voltando à distribuição dos clubes na temporada que agora arranca, as associações de futebol do Porto e de Braga têm nove clubes, metade do campeonato, enquanto Lisboa possui quatro clubes, os mesmos que a Associação de Futebol de Setúbal tinha há 50 anos. O historiador Francisco Pinheiro, um dos principais estudiosos do desporto e da imprensa desportiva em Portugal, sendo um dos fundadores do Grupo História e Desporto, refere ao Jornal de Guimarães que “estes ciclos hegemónicos não se podem dissociar das mudanças da sociedade portuguesa”.

Hegemonia em fluxo: a queda de Setúbal e a ascensão do Minho
Numa primeira análise ao mapa, percebe-se que apenas cinco clubes se mantêm nas três edições selecionadas. Ao Vitória SC, juntam-se Benfica, Porto, Sporting e Boavista no leque de clubes que, há 50 e 25 anos, disputaram a 1.ª Divisão. Daí partimos para a conclusão principal: clubes como Montijo, CUF e Barreirense deslizaram por aí abaixo, e o Vitória de Setúbal deambula pelo terceiro escalão. Região com forte tradição no futebol, Setúbal deixou de ter representação.
Apenas representada pelo Vitória SC em 1972/73, a Associação de Futebol de Braga dá hoje cinco emblemas à Liga Bwin: Sporting de Braga, Gil Vicente, Famalicão e Vizela completam um leque que, na época passada, tinha ainda o Moreirense.
“A mudança é mais acentuada de 72/73 para 97/98 do que para propriamente nos últimos 25 naos”, analisa Francisco Pinheiro. “Há ciclos hegemónicos em determinadas regiões que se notam no futebol devido a vários fatores. Desde logo o fator económico, depois a estruturação e também a rivalidade”, expõe o historiador, que indica a perda de força fabril na península de Setúbal como um dos motivos para a queda dos clubes referidos. “O Minho é uma região relativamente forte do ponto de vista económico, tal como era Setúbal nos anos 70”, aponta.
Rivalidade a norte, uma das explicações para o crescimento
Para além da vertente económica, Francisco Pinheiro é da opinião de que há outros fatores associados a esta transferência de preponderância do futebol de Setúbal, sempre aliada a Lisboa, para norte. As rivalidades existentes a norte são outro fator, assim como a capacidade de profissionalização.
“Normalmente a rivalidade é visto como algo mau, mas nem sempre tem de ser visto assim. Na parte em que a rivalidade é saudável faz com que os clubes possam melhorar. A norte há mais rivalidades locais, que incentivam ao crescimento mútuo. A identidade e o orgulho no clube da terra beneficiam o desenvolvimento”, esclarece o historiador.
Ainda na visão deste estudioso sobre a história do futebol, a norte o processo de profissionalização dos clubes foi mais eficaz e muniu as coletividades de ferramentas que lhes permitem maior estabilidade. “Na região do Porto, e litoral, juntando-se Braga, para além da rivalidade, esses clubes foram os que melhor fizeram o processo de profissionalização, desprendendo-se dos financiamentos de empresas e até de autarquias. Isso permitiu-lhes fazer uma gestão diferente da gestão amadora que vinha dos anos 80 e 90: essa profissionalização está a beneficiar a estabilidade destes clubes”, dá nota.

Mais viagens, mas mais curtas
Olhando para as implicações que estas mudanças acarretam para o Vitória SC, em termos de deslocações, quer para a equipa, quer para os adeptos, há muito menos quilómetros de estrada a percorrer, excluindo-se as deslocações às ilhas, inexistentes há 50 anos. Atualmente até há mais jogos fora de portas no calendário, mas implicam deslocações menores.
As deslocações de quase 400 quilómetros ao Barreiro e a Setúbal foram substituídas por curtas viagens a Famalicão, Vizela ou Barcelos, o que se reflete nos números. Em 72/73 o Vitória percorreu 4331 quilómetros de estrada e esta época terá de percorrer apenas 2225, nos quais já se incluem os 108 quilómetros da primeira jornada, da deslocação a Chaves.
A diminuição do número de quilómetros tem sido gradual, perdendo-se sensivelmente 1000 quilómetros a cada 25 anos, uma vez que em 97/98 a equipa do Vitória SC percorreu 3464 quilómetros nas 16 viagens por território continental.