Amadeu Portilha: “Estamos a trabalhar a cinco por cento da capacidade”
Com as portas fechadas aos utentes, a Tempo Livre perdeu cerca de 1,5 milhões de euros de receita em 2020 e tem-se cingido à investigação e à oferta de cursos aos agentes desportivos.

A pandemia quase reduziu a nada uma dinâmica que envolvia milhares de pessoas a transitarem diariamente nas instalações desportivas da cooperativa. As receitas caíram a pique e o lay-off foi a solução encontrada para a larga maioria dos quadros. Apesar das condicionantes, Portilha orgulha-se do trabalho na investigação e na formação, sobretudo com dirigentes desportivos locais, e confirma o regresso do centro de deteção de talento desportivo à Tempo Livre neste ano.
Quão a Tempo Livre foi afetada por esta pandemia?
A Tempo Livre sofreu terrivelmente com esta pandemia. Não há outra forma de dizer isso. No complexo de piscinas de Guimarães, perdemos 80% dos nossos utentes. É uma coisa brutal. No projeto Vida Feliz, passámos de 1200 utentes para 70. Nós, instalações desportivas, fomos sempre os primeiros a fechar e os últimos a abrir. O impacto é brutal quer em termos de utentes, quer em termos financeiros. Estimamos que, só no ano passado, perdemos cerca de um milhão e meio de euros de receita. Sendo uma empresa do setor empresarial local, a câmara apoiou-nos muito para que conseguíssemos sobreviver. Quando mandam fechar uma instalação desportiva, deixa de entrar um único cêntimo nos cofres desde o momento em que fecha até ao momento em que reabre. No ano passado, estivemos fechados três meses. Neste ano, para lá caminhámos, porque fechámos a 15 de janeiro. Temos esta capacidade de nos adaptarmos às circunstâncias. Enquanto não abrimos, vamos fazendo outras coisas. Criámos o Centro de Estudos do Desporto, temos feito cursos de formação de dirigentes, que estão sempre esgotados. E estamos envolvidos em dois grande projetos internacionais: um de liderança no desporto no feminino, com a Paula Nogueira a ter um papel de grande preponderância nisso, e outro onde somos coordenadores, que é o projeto SPACHE – a promoção do desporto em ambientes de património mundial, que nos está a dar grande gozo. Não parámos, mas estamos a trabalhar a cinco por cento da nossa capacidade e da nossa vontade.
Relativamente ao contrato-programa com a câmara, como é o avalia?
A câmara foi absolutamente impecável. O senhor presidente e o senhor vereador tiveram a sensibilidade para perceber que a Tempo Livre é um ativo fundamental desta cidade e que não podia ser prejudicada por causa de um confinamento e de um encerramento de instalações que não depende da nossa vontade. No passado, foi feito um contrato-programa suplementar de quase 600 mil euros que nos permitiu sobreviver. A Tempo Livre gere nove instalações e tem 160 funcionários. Neste momento, à exceção dos professores que continuam a dar aulas na escola, temos toda a gente em lay-off, quer no ano passado, quer neste ano. Estamos a trabalhar cinco num universo de 82 funcionários do quadro. Já 42 espetáculos foram cancelados no Multiusos. Neste ano, já tínhamos o primeiro semestre cheio de atividade. Está tudo a ser cancelado ou projetado para o segundo semestre, mas também não sabemos o que vai ser o segundo semestre. Isto é terrível para nós, porque estávamos habituados a um ritmo de trabalho frenético todos os dias, com milhares de pessoas a entrarem nas piscinas de Moreira, de Brito, de Guimarães, na pista de atletismo, no Multiusos, na academia de ginástica. De repente, zero.
“Se o talento desportivo está no recreio de uma escola, creio que os clubes devem procurar esse talento, aproveitá-lo e disseminá-lo pelo tecido desportivo local”
E o Centro de Estudos do Desporto? Quantos estudos já produziu? Em que áreas?
Desde que o centro de estudos foi lançado, há três anos, todos os anos fazemos um estudo muito importante para o conhecimento do setor desportivo de Guimarães: a análise da procura e da oferta desportiva em Guimarães. Ou seja, junto das federações e dos clubes, fazemos uma listagem muito rigorosa do número de praticantes desportivos. Fizemos um sobre parques de lazer em Guimarães. Fizemos agora este último sobre o impacto da pandemia. Fizemos um sobre o impacto da pandemia nas nossas instalações. Temos muita coisa em marcha. Fizemos vários cursos ligados ao marketing do desporto, ao envelhecimento ativo, à saúde e à medicina. Temos dado um contributo valiosíssimo para uma área às vezes desprotegida e desmerecida no desporto, que é a capacitação dos agentes. Isso é fundamental para termos mais desporto e melhor desporto no futuro.
Outro dos projetos desportivos que surgiu em Guimarães é o centro de deteção de talentos? Apesar de parado, devido à pandemia e ao encerramento das escolas, tem tido sucesso em identificar crianças e jovens com potencial para a prática desportiva?
O centro de deteção de talento desportivo foi um projeto muito giro, que começou com Guimarães - Cidade Europeia do Desporto, em 2013. Nasceu no seio da Tempo Livre, mas, depois, por uma conjuntura complicada com base na Lei do Setor Empresarial Local de 2014, teve de passar para a câmara durante alguns anos. Neste ano, vai regressar para o seio da Tempo Livre. Vamos retomar rapidamente esse projeto, que é do maior interesse, porque continuo a acreditar, como acreditava quando lancei o projeto em 2013, que é no recreio da escola que está o talento desportivo. Se o talento desportivo está no recreio de uma escola, creio que os clubes devem procurar esse talento, aproveitá-lo e disseminá-lo pelo tecido desportivo local. Não há recreios de escola em que possamos estar, mas logo que a normalidade regresse, o centro de deteção de talento desportivo vai regressar com grande força, agora novamente incorporado na Tempo Livre.
Até à pandemia, como olhava para o desporto em Guimarães, seja na prática informal, seja na competição? Que forças e fraquezas tem este território?
Guimarães é objetivamente uma referência a nível nacional, quer ao nível formal, quer ao nível informal. Nos últimos anos, Guimarães deu um salto muito grande em termos de infraestruturas desportivas, com a dezena de relvados sintéticos que está a ser construída com o apoio da câmara até à academia de ginástica, um edifício notável do ponto de vista da arquitetura, da sustentabilidade e do impacto em Guimarães. Guimarães é um exemplo na promoção que faz da oferta desportiva. Não somos uma cidade em que só se praticam os desportos tradicionais. Vamos permanentemente à procura de mais oferta desportiva. Nos últimos anos, e muito por culpa da Tempo Livre, apareceu a patinagem, o râguebi, a ginástica, porque a Tempo Livre teve a coragem de lançar pequenas escolinhas da modalidade que depois resultaram em grandes projetos desportivos e grandes clubes. Hoje, o Guimagym tem mais de mil atletas. O GRUFC tem mais de 100 atletas. A Academia de Patinagem tem cerca de 200 atletas. São projetos já muito consolidados. Tem algo que considero de um valor absolutamente extraordinário, o maior sucesso que conseguimos nos últimos anos, que é um tecido associativo de elevada qualidade. Temos belíssimos dirigentes, que apostam na qualificação dos seus técnicos, dos seus recursos, dos seus meios de trabalho, e presidentes jovens com capacidade de trabalho e visão de futuro muito acentuada. Com o regresso à normalidade acontecendo neste ano, estou convencido de que vamos lamber as feridas, cicatrizá-las muito rapidamente e muito em breve estaremos novamente pujantes e vibrantes, continuando a fazer de Guimarães uma das cidades mais importantes a nível nacional no setor desportivo.