A boina do Álvaro e o povo
Quando, em 2019, entrevistei, para o Notícias de Fafe, o então treinador da AD Fafe, ele disse-me: “Foi a primeira grande entrevista que dei”. Olhando ao currículo, não era estranho que assim fosse.

Fora adjunto muitos anos e estava a emancipar-se na profissão. Álvaro Pacheco desde logo surpreendeu pelo discurso. Aqui poderia falar de dois tipos de discurso: o que normalmente os treinadores têm para fora e o outro que têm no balneário.
No caso de Álvaro Pacheco acho que o discurso é uno. Assisti, sem nunca me mostrar, a muitos treinos dessa época e apreciava a forma como o treinador falava com os jogadores. Eram injeções de moral a cada exercício, ânimo sempre elevado ao extremo e um cuidado especial a falar com aqueles que jogavam menos. Os ‘aziados’ do plantel recebiam mimos a rodos com Álvaro Pacheco. Aquela forma de estar cativava-me. Se no aspeto comunicacional os treinos eram fantásticos também no resto havia frutos. Os exercícios feitos vezes sem conta nos treinos eram depois replicados no jogo e quem assistia percebia esse decalque. As coisas não eram feitas por acaso.
Estava longe de imaginar, nessa altura, que Álvaro Pacheco teria a ascensão meteórica que se conhece, mas percebia que ali havia qualquer coisa de diferente.
Em Vizela o discurso manteve-se. A relação com os adeptos, o puxar pelos valores da terra, das raízes do clube, o fazer com que os futebolistas joguem com intensidade, que disputem cada lance como se fosse o último de uma final da Liga dos Campeões.
E depois veio a boina. A forma como Álvaro Pacheco soube capitalizar o facto de usar uma boina no banco de suplentes é extraordinária. Se José Maria Pedroto era o Zé do Boné, se João Alves ficou conhecido como o Luvas Pretas, já ninguém duvida que Álvaro Pacheco será reconhecido, também, pela boina. Tão marcante que no último Carnaval houve meninos em Vizela que se mascararam do treinador da equipa da sua terra. Este gesto foi extraordinário e mostra a ligação do treinador à terra, do tal discurso que passa, que motiva e agrega em torno de um objetivo. Não é de discursos muito elaborados mas é direto, sincero e quase sempre justo nas apreciações. Fala a linguagem do futebol, a linguagem do povo e o povo retribui. Não sejamos ingénuos ao ponto de pensar que o homem da boina ficará em Vizela para sempre e, aqui e ali, até já foi contestado pelos vizelenses. É assim a ditadura dos resultados.
Mas, não olvidem, que treinadores como Álvaro Pacheco a juntar a gente bairrista como a de Vizela fazem falta ao futebol português. Jogar em Vizela, contra a equipa da casa, não é tarefa fácil para ninguém e se mais ‘Vizelas’ e ‘Álvaros’ houvesse no futebol português o espetáculo ganhava.
Confesso-me fã de treinadores e clubes assim.